Blog do Durango

Tecnologia sem compaixão: o mito do bilinário salvador

Elon Musk virou uma espécie de símbolo moderno: aquele que veste o manto da inovação enquanto deixa um rastro de abandono pelo caminho. De visionário a figura quase messiânica, ele representa algo que vai muito além da tecnologia — é a glorificação do progresso que ignora gente. E o problema nem é só o que ele faz, mas o que ele representa: um tempo em que eficiência vale mais do que compaixão.

Quando assumiu o DOGE no governo Trump, a lógica parecia simples: cortar o que não dá lucro. A conta? Programas de ajuda humanitária, vacinas, nutrição infantil. A USAID foi desmontada como se fosse um aplicativo obsoleto. O impacto disso? Gente morrendo em silêncio, fora das planilhas. A crítica de Bill Gates não foi exagero: se há crianças morrendo por falta de assistência básica, há responsabilidade. E ela tem nome.

Não é só uma questão de política pública. É uma mentalidade. A mesma que acredita que mandar foguete pra Marte é mais importante do que garantir saneamento básico aqui. A mesma que cancela ajuda a Moçambique porque confundiu Gaza, na África, com a Faixa de Gaza, no Oriente Médio. Pode parecer piada, mas é trágico: decisões com impacto global sendo tomadas na base do erro geográfico — e da indiferença.

E a idolatria em torno dele só piora tudo. Crítica virou crime. Questionamento é tratado como inveja. Ele pode fazer qualquer coisa — manipular o mercado com um tweet, desinformar, desestruturar políticas públicas — que haverá sempre um séquito pronto pra defender. O culto à genialidade virou escudo pra crueldade.

Enquanto isso, a realidade é que a tal “humanidade multiplanetária” é só um slogan bonito. Porque aqui mesmo, no planeta em que vivemos, a sobrevivência segue sendo um privilégio. Musk mira Marte, mas parece incapaz de enxergar o chão onde pisa. E essa dissonância moral diz muito sobre a época em que vivemos.

No fim, não se trata de odiar o bilionário da vez. Trata-se de recusar a lógica que ele encarna: a de que tudo pode ser otimizado, até a dor dos outros. Se é esse o futuro que está sendo vendido, talvez seja hora de pedir o reembolso.

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